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A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

FCO. CLÁUDIO DE A. SANTOS
Ministro do STJ; aposentado; Advogado em Brasília

1. Generalidades.
Posta em dúvida, a existência da pessoa jurídica no Dir. Romano (apesar da existência da societas vectigaliumsocietas publica que reunia um acervo de capitais), certo é que as primeiras reflexões a respeito de uma personalidade de entes desprovidos de humanidade datam dos séculos VI e VII.
Teria surgido na Inglaterra a concessão de personalidade, dependente em seus primórdios de um alvará ou carta do Rei (royal charter) que acarretava a limitação do envolvimento patrimonial de seus sócios.
A noção teria sido aprimorada, adiante, pelo Direito Canônico, no intuito de tornar possível a detenção dos meios de produção pelas sés católicas. Surgiram as corporações de mão-morta (corporações de caráter perpétuo com fins religiosos) e as universalidades de direito.
Depois disso, vieram os comerciantes das cidades litorâneas do Mediterrâneo e do Atlântico Norte que, para construção das grandes naus e projetos de circunavegação, formularam a idéia da comunhão de interesses, semelhante a um condomínio, até o surgimento das companhias, séculos depois.
Diz-se, com freqüência, que as empresas nasceram na Idade Média. Certamente, o embrião das sociedades por ações surgiu com as companhias, como a Companhia das Índias Ocidentais, que descobriram o novo mundo e as Orientais, que se voltaram para a África.
A expressão pessoa jurídica (antes era comum a expressão pessoa moral) remonta ao começo do Século XIX e, segundo os registros, foi divulgada por Savigny, o que conferiu prestígio à expressão.
Não vamos aqui discutir as inúmeras teorias sobre a ontologia da pessoa jurídica. Limitemos a análise ao seguinte: para uma forte corrente da doutrina do direito comercial, o problema da personalidade jurídica, em especial, das sociedades comerciais, comporta um tratamento prático. É o que pensa Rubens Requião, a afastar as digressões polêmicas sobre a teoria da pessoa jurídica (v. Curso, v. 1, ps. 260/261 e Aspectos modernos de direito comercial, v. i, p. 70).
Diversas são as teorias acerca da natureza da pessoa jurídica. Daí Fábio Ulhoa Coelho (v. Desconsideração da personalidade jurídica, SP: RT, 1989, ps. 65/66) entender que a melhor forma de examiná-las é agrupá-las em dois fundamentais segmentos: a dos defensores da idéia de que a pessoa jurídica, enquanto realidade pré-jurídica, existia antes do direito reconhecer-lhe a personalidade; e a dos defensores do entendimento segundo o qual a pessoa jurídica é uma criação do direito.

2. Pessoa Jurídica.
Observam os estudiosos que, nos mais diversos modelos jurídicos, a noção de pessoa jurídica resulta de uma afetacão patrimonial, com vistas a atribuir a um monte patrimonial uma personalidade e, por conseqüência, dar-lhe capacidade e perenidade. É o que acontece com freqüência, muito embora possam as pessoas jurídicas serem constituídas apenas de pessoas.
Vejamos alguma definições da espécie.
- Ruggiero ensina que pessoa jurídica pode definir-se “qualquer unidade orgânica resultante de uma coletividade organizada de pessoas ou de um complexo de bens a que, para consecução de um fim social duradouro e permanente, é pelo Estado reconhecida uma capacidade de direitos patrimoniais.” (Roberto de Ruggiero, Instituições de Direito Civil, vol. I, trad. da 6ª. edição italiana, Campinas: Bookseller Editora e Distribuidora, p. 550);
- Para Orlando Gomes são “entes formados pelo agrupamento de homens, para fins determinados, que adquirem personalidades distintas dos seus membros. Reconhece-lhes a lei capacidade de ter direitos e contrair deveres” (Orlando Gomes, Introdução ao Direito Civil, 10ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1990, p.191);
- Ulhoa Coelho diz que o“instituto da pessoa jurídica é uma técnica de separação patrimonial. Os membros dela não são os titulares dos direitos e obrigações imputados á pessoa jurídica. Tais direitos e obrigações formam um patrimônio distinto do correspondente aos direitos e obrigações imputados a cada membro da pessoa jurídica”. (Fabio Ulhoa Coelho, Curso de Direito Civil, vol. I. São Paulo: Saraiva, 2003, p.232);
Francisco Amaral lembra que os “sujeitos de direito podem ser pessoas naturais ou físicas, se coincidentes com o ser humano, e pessoas jurídicas, quando são entidades ou organizações unitárias de pessoas ou de bens a que o direito atribui aptidão para a titularidade de relações jurídicas.”;
Continua o mesmo autor: “A pessoa jurídica é, então, um conjunto de pessoas ou de bens, dotado de personalidade jurídica. Por analogia com as pessoas físicas, a ordem jurídica disciplina o surgimento desses grupos, reconhecendo-os como sujeitos de direito. Sua razão de ser está na necessidade ou conveniência de as pessoas singulares combinarem recursos de ordem pessoal ou material para a realização de objetivos comuns, que transcendem as possibilidades de cada um dos interessados por ultrapassarem o limite moral da sua existência ou exigirem a prática de atividades não-exercitáveis por eles. Organizam-se, assim, de modo unitário, pessoas e bens, com o reconhecimento do direito que atribui personalidade ao conjunto que passa a participar da vida jurídica.” (Francisco Amaral, Direito Civil : Introdução, 6.ª ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2006, os.275/276).  

3. Personificação.
Efeitos da personificação (capacidade para o exercício de direitos) da pessoa jurídica (o CC de 1916 dispunha em seu art. 20, caput, que “as pessoas jurídicas têm existência distinta da dos seus membros” – sem disposição correspondente no CC 2002), segundo Amaral e Lovato:
a) forma-se um novo centro de direito e deveres, cotado de capacidade de direito e de fato, e de capacidade judicial;
b) esse centro de direitos tem autonomia em relação às pessoas naturais que o constituem;
c) o objetivo econômico desse centro é distinto do objetivo econômico de seus membros;
d) sua autonomia patrimonial faz com que não se confundam o seu patrimônio com os de seus membros;
e) as relações jurídicas da pessoa jurídica são independentes das de seus membros;
f) a responsabilidade civil da pessoa jurídica é independente da responsabilidade de seus membros (hoje já não se pode afirmar que a pessoa jurídica não tem responsabilidade penal).

Tratando-se como vimos a pessoa jurídica de uma criação da lei, também à lei, nos sistemas jurídicos como o nosso vinculado à civil law, cabe dispor sobre situações em que a personalidade daquelas pode ser desestimada ou desconsiderada.
O direito à personalização jurídica é, portanto, relativo.
Na verdade, no Séc. XIX, a doutrina e a jurisprudência passaram a preocupar-se com os desvios na utilização da pessoa jurídica, ou seja, com o mau uso daquela personificação, verificando-se a necessidade de utilização de meios para reprimir aquelas formas abusivas como maneira de preservar o próprio instituto da pessoa jurídica.
Segundo Verrucoli, surgiu dos estudos elaborados por um autor alemão chamado Haussmann, desenvolvida na Itália por Mossa, uma teoria denominada Teoria da Soberania, que pretendia imputar ao controlador de uma sociedade de capitais as obrigações assumidas pela sociedade e por ela não satisfeitas, em detrimento da estrutura formal assegurada pelo direito. Não vingou tal teoria, até porque seria a negação da própria pessoa jurídica.
Mas, desenvolveu-se na common law, na Inglaterra e nos Estados Unidos, uma teoria amplamente difundida, chamada disregard doctrine, que preserva a personificação das pessoas jurídica, mas a desconsidera quando se verifica o desvio da finalidade da pessoa jurídica para encobrir abusos de direito, fraudes e confusão patrimonial.
A teoria passou a ser aplicada na Europa continental e no resto do mundo para coibir os desvios quanto a separação patrimonial. E assim surgiu no Brasil. Veremos adiante que se atribui ao grande comercialista paranaense, Prof. Rubens Requião a introdução do tema na doutrina brasileira.
Há algumas décadas, a jurisprudência, com certas reservas, sobretudo preocupada com as garantias do contraditório e do devido processo legal, mesmo antes da Constituição de 1988, deu alguns sinais de que os desvios deveriam ser coibidos.

4. A legislação.
Examinemos a legislação brasileira com alguma pertinência ao assunto.
Algumas disposições legais, algumas bem antigas, são apontadas como hipóteses normativas de desconsideração (total ou parcial, ou, ainda, específica, algumas, na verdade, são casos de mera responsabilidade, como demonstraremos):

- Decreto 3.708/1919, Soc. Ltda., arts. 10 e 16:
10. Os sócios-gerentes ou que derem o nome à firma não respondem pessoalmente pelas obrigações contraídas em nome da sociedade, mas respondem para com esta e para com terceiros solidária e ilimitadamente pelo excesso de mandato e pelos atos praticados com violação do contrato ou da lei.
16. As deliberações dos sócios, quando infringentes do contrato social ou da lei, dão responsabilidade ilimitada àqueles que expressamente hajam ajustado tais deliberações contra os preceitos contratuais ou legais.
Sobre a questão, dispõe o art. 1.080 do CC: “As deliberações infringentes do contrato ou da lei tornam ilimitada a responsabilidade dos que expressamente as aprovaram.”
Tais normas da lei das limitadas não tratam, na verdade, da desconsideração, mas apenas da aplicação da teoria conhecida como ultra vires.
Procedente, sem dúvida, é a crítica de Walfrido Jorge Warde Júnior (transcrita no livro Desconstruindo a Desconsideração da Personalidade Jurídica, de Márcio Tadeu Guimarães Nunes, SP: Quartier Latin, 2007, ps. 48/49) relativamente aquela normatividade:
“A teoria da desconsideração da personalidade jurídica surgiu, então, como instrumento da reforma, sem que nos déssemos conta de que o sistema, i. e., a disciplina da responsabilidade, já dispusesse de elementos para implementá-la. Tais elementos, aliás, pela intrínseca compatibilidade com o sistema, não padecem da extrema subjetividade da exógena disregard doctrine.
A aplicação da disciplina da responsabilidade – com o fim de imputar responsabilidade - por outro lado, independe de precisar-se, invariavelmente por imposição, o que é ´abuso da personalidade jurídica`, ´desvio da finalidade`, ´fraude`, ´abuso de direito`.
No Brasil, mais recentemente, o legislador (cf. artigo 50 do Código Civil) ao invés de apegar-se à disciplina da responsabilidade contida em nosso dirieto societário, pretendeu modificar a disregard doctrine, como absorvida por nossos tribunais, - para transformá-la em versão aproximada da, já obsoleta, teoria objetiva do abuso (Objektive Mibbrauchlehre).
O direito disciplina a responsabilidade para além da teoria da desconsideração, dispõe de regras precisas para imputação de responsabilidade. Muitas vezes, essa disciplina – quando aplicada – simplesmente por determinar imputação de responsabilidade, é associada à disregard doctrine. Em verdade, ambas não se confundem, quer pela ´técnica, quer pelos fundamentos empregados.”

- DL 5.452/1943, CLT, art.º 2º, § 2º:
Art. 2º ........ § 2º - Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas

A disposição contida na CLT mais se aproxima de uma hipótese de responsabilidade solidária do que da disregard.

- Lei 5.172/1966, CTN, arts. 116, par. un., 134, caput e VII, e 135, III:
Art. 116. ............ Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária. (Incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001)
Art. 134. Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis: ......... VII - os sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas.
Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: .............. III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
As normas tributárias também não envolvem hipóteses de desestimação do princípio da autonomia ontológica da pessoa jurídica, mas de responsabilidade dos sócios e administradores pelas obrigações tributárias da sociedade. A norma contida no par. ún. do art. 116, por sua vez, contempla hipótese de desconsideração de negócio jurídico para fins tributários e manda observar os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária.

- Lei 6.404/1976, S/A, art. 117:
Art. 117. O acionista controlador responde pelos danos causados por atos praticados com abuso de poder. § 1º São modalidades de exercício abusivo de poder: a) orientar a companhia para fim estranho ao objeto social ou lesivo ao interesse nacional, ou levá-la a favorecer outra sociedade, brasileira ou estrangeira, em prejuízo da participação dos acionistas minoritários nos lucros ou no acervo da companhia, ou da economia nacional; b) promover a liquidação de companhia próspera, ou a transformação, incorporação, fusão ou cisão da companhia, com o fim de obter, para si ou para outrem, vantagem indevida, em prejuízo dos demais acionistas, dos que trabalham na empresa ou dos investidores em valores mobiliários emitidos pela companhia; c) promover alteração estatutária, emissão de valores mobiliários ou adoção de políticas ou decisões que não tenham por fim o interesse da companhia e visem a causar prejuízo a acionistas minoritários, aos que trabalham na empresa ou aos investidores em valores mobiliários emitidos pela companhia; d) eleger administrador ou fiscal que sabe inapto, moral ou tecnicamente; e) induzir, ou tentar induzir, administrador ou fiscal a praticar ato ilegal, ou, descumprindo seus deveres definidos nesta Lei e no estatuto, promover, contra o interesse da companhia, sua ratificação pela assembléia-geral; f) contratar com a companhia, diretamente ou através de outrem, ou de sociedade na qual tenha interesse, em condições de favorecimento ou não equitativas; g) aprovar ou fazer aprovar contas irregulares de administradores, por favorecimento pessoal, ou deixar de apurar denúncia que saiba ou devesse saber procedente, ou que justifique fundada suspeita de irregularidade; h) subscrever ações, para os fins do disposto no art. 170, com a realização em bens estranhos ao objeto social da companhia.  (Incluída dada pela Lei nº 9.457, de 1997); § 2º No caso da alínea e do § 1º, o administrador ou fiscal que praticar o ato ilegal responde solidariamente com o acionista controlador. § 3º O acionista controlador que exerce cargo de administrador ou fiscal tem também os deveres e responsabilidades próprios do cargo.
Art. 158. O administrador não é pessoalmente responsável pelas obrigações que contrair em nome da sociedade e em virtude de ato regular de gestão; responde, porém, civilmente, pelos prejuízos que causar, quando proceder: I - dentro de suas atribuições ou poderes, com culpa ou dolo; II - com violação da lei ou do estatuto.
A lei das S/A parece tratar também de aplicação da teoria ultra vires, e não de desconsideração da personalidade.

- Lei 8.078/1990, CDC, art. 28:
Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.§ 1° (Vetado). § 2° As sociedades integrantes dos grupos societários e as sociedades controladas, são subsidiariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código. § 3° As sociedades consorciadas são solidariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código. § 4° As sociedades coligadas só responderão por culpa. § 5° Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.
No que tange ao CDC, conforme entendimento majoritário, a aplicação da teoria da desconsideração é aplicada, na realidade, nos casos de abuso de direito; nos demais casos, há responsabilidade direta daquele que infringe a lei ou administra mal a sociedade. O § 5º do art. 28 deve ser interpretado restritivamente, sob pena de alcançar ampliação insustentável do instituto. É uma hipótese de responsabilização direta do sócio, sem atenção à personalidade da sociedade empresarial.
 

- Lei 8.884/1994, Antitrust, art. 18:

Art. 18. A personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser desconsiderada quando houver da parte deste abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.

A lei antitrust cuida da desconsideração, da teoria ultra vires e também da responsabilização direta nos casos de falência ou de má administração.

- Lei 9.605/1998, Dir. Ambiental, arts. 2º, 3º e 4º:
Art. 2º Quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes previstos nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua culpabilidade, bem como o diretor, o administrador, o membro de conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la.
Art. 3º As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.

Parágrafo único. A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato.

Art. 4º Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente
A lei ambiental responsabiliza a todos administrativa, civil e criminalmente (até a pessoa jurídica) e diz que quando a personalidade for obstáculo para o ressarcimento do dano ambiental ela será desestimada. Trata-se de um exagero, mas como a pessoa jurídica é criação legal, conforme já foi exposto, também a lei pode despersonalizá-la.

- Lei 11.195/2005, REPES (Regime Especial de Tributação para a Plataforma de Exportação de Serviços de Tecnologia da Informação), art. 129:
Art. 129. Para fins fiscais e previdenciários, a prestação de serviços intelectuais, inclusive os de natureza científica, artística ou cultural, em caráter personalíssimo ou não, com ou sem a designação de quaisquer obrigações a sócios ou empregados da sociedade prestadora de serviços, quando por esta realizada, se sujeita tão-somente à legislação aplicável às pessoas jurídicas, sem prejuízo da observância do disposto no art. 50 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil

A lei do Repes, como se vê, recorre à aplicação do art. 50 do CC.

Finalmente, apareceu o Código Civil, a dispor em seu art. 50:

“Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.”

5. Conclusão.
A verdade é que a empresa deve ser preservada, não podendo ser desconsiderada irrestritamente, sob pena de trazer prejuízos para o mercado e para a própria comunidade.
A desconsideração não pode se confundir com a teoria ultra vires, e se esta, prevista na lei, é suficiente para responsabilizar o sócio ou administrador da sociedade, deve ser o caminho preferido.
“A doutrina da desconsideração nega precisamente o absolutismo do direito da personalidade jurídica. Desestima a doutrina esse absolutismo, perscruta através do véu que a encobre, penetra em seu âmago, para indagar de certos atos dos sócios ou do destino de certos bens. Apresenta-se, por conseguinte, a concessão da personalidade jurídica como um significado ou um efeito relativo, e não absoluto, permitindo a legítima penetração inquiridora em seu âmago.” São palavras de Rubens Requião, na sua divulgada conferência proferida na Faculdade de Direito da UFP, por ocasião do centenário de nascimento de seu fundador e catedrático de Dir. Comercial, Des. Vieira Cavalcanti Filho, no final da década de 1960 (RT, n. 410, p. 12-24).
O objetivo da teoria da desconsideração é coibir os abusos e condenar a fraude, através do uso da pessoa jurídica.
Mas o art. 50 do Código Civil tem recebido severas críticas e, na realidade, não vem sendo bem aplicado pelo Poder Judiciário.
A norma surgiu no Anteprojeto do Código Civil, em atenção à sugestão de Requião que enviou à Comissão cópia de sua palestra proferida na Faculdade de Direito do Paraná. O texto enviado à Câmara foi de uma infelicidade impar, pois previa, inclusive, a dissolução da pessoa jurídica. Requião, em palestra proferida na Câmara, em outubro de 1975, insistiu em que se acolhesse a doutrina em sua pureza original e apresentou sugestão desta emenda: “A pessoa jurídica não pode ser desviada dos fins que determinam a sua constituição, para servir de instrumento ou cobertura à prática de atos ilícitos ou abusivos de sócios. Neste caso, o juiz, desconsiderando a existência da personalidade jurídica, a pedido do credor do sócio, poderá permitir a efetivação de sua responsabilidade sobre os bens incorporados na sociedade para a sua participação no capital social”. A sugestão era um tanto quanto ingênua, porque conferia legitimidade apenas ao credor do sócio.
Aprovado na Câmara, sem a emenda sugerida por Requião, o Projeto chegou ao Senado e lá, o relator Senador Josaphat Marinho consultou o professor Fábio Konder Comparato, e, segundo o relator, o texto proposto pelo ilustre jurista, com ligeira alteração de redação, ficou como está no Código (art. 50).
Importa agora interpretar o que está posto no Código. E uma primeira indagação é saber em que consiste o abuso de direito?
Diz-se que a repressão ao ato ilícito como violação danosa a um direito é insuficiente. Daí a categoria do abuso do direito criado para reprimir os atos, que embora praticados com estrita observância da lei, violam o seu espírito. A repressão ao abuso encontra-se no art. 187 do CC (“Também comete ato lícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”). Para o Min. Ruy Rosado é a cláusula mais rica do direito das obrigações (Palestra em Joinville em abril de 2000), por conter princípios éticos, como o do abuso do direito, a boa-fé, os bons costumes e o fim social, sob as vestes de um critério objetivo. Mas está mal colocado, pois segundo a mais moderna doutrina não se perquire sua ilicitude, e a norma se encontra no título dos “atos ilícitos”.
No caso do abuso quando à personificação ele pode se manifestar, conforme a lei, pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial.

Deve o intérprete ser cuidadoso na constatação do desvio de finalidade e na definição do que deve ser entendido como confusão patrimonial. Com certeza, não é simplesmente uma dívida não paga por uma empresa que vai justificar a expropriação de bens do sócio ou uma dívida da pessoa natural do sócio que vai permitir a penhora de bens da empresa. É preciso evidenciar-se que algo foi praticado para esconder sob o véu da pessoa jurídica a prática de um ato contrário ao direito e lesivo aos direitos de alguém.

 
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